Ciclo de debates discute reforma tributária no contexto da pandemia
A OAB Nacional promoveu, na tarde desta segunda-feira (20), a última rodada do 2º Ciclo de Debates da Comissão Especial de Direito Tributário. O tema da discussão foi “Reflexos da Pandemia na Reforma Tributária”, realizado já sob a expectativa do encaminhamento do projeto do Governo Federal ao Congresso Nacional que propõe modificações no sistema. A iniciativa recebeu críticas de setores da sociedade que aguardavam por uma reforma ampla do sistema tributário nacional. O presidente da OAB Nacional, Felipe Santa Cruz, assinalou a importância do tema ao participara da abertura.
“A discussão do sistema tributário tem uma importância estruturante na organização de qualquer estado nacional. Tem sido muito difícil esse debate. É uma matéria polêmica”, disse Santa Cruz. Ele chamou a atenção para a situação de milhões de brasileiros que perderam o emprego no contexto da pandemia e que passaram a depender do auxílio governamental. Santa Cruz reconheceu os esforços do ministro da Economia, Paulo Guedes, e de sua boa vontade com a advocacia, mas criticou a abordagem do projeto apresentado pelo governo.
“Quando o ministro fala em fim de imposto de renda das empresas e fala em volta de CPMF, aumento de PIS Cofins e em tributação de dividendos, isso nos parece fora de hora e fora de propósito. Somos parte de uma economia em crise aguda, doente e a solução que se apresenta é tirar oxigênio. Aumentar a carga tributária de quem nada mais tem para dar, é transferir a conta para os mais pobres”, criticou o presidente da OAB. “Temos a necessidade de uma verdadeira reforma tributária, onde efetivamente corrija a injustiça que há no modelo tributário brasileiro, um país que, também por causa do modelo tributário, é o sétimo mais desigual do mundo”.
Coordenador dos trabalhos, o presidente da comissão, Eduardo Maneira, também criticou a iniciativa do governo e defendeu as duas propostas de emenda à Constituição (PEC) que já tramitam no Congresso deveriam nortear a discussão sobre o assunto. “Ambas pretendem reformar o sistema tributário na Constituição, principalmente na questão da tributação do consumo. O que se anuncia nessa proposta do governo é outra coisa, é aumento de carga tributária, não corrige as distorções do nosso sistema”, disse ele.
“Uma reforma tributária exige um grande concerto nacional, consenso e uma pacificação política para que ela possa ser realizada. Não sei se estamos nesse momento falando só da pandemia sem falar nas outras circunstâncias que causam muita turbulência no momento nacional. Trata-se de um tema da maior importância para o país e a OAB não se omitirá no debate. A Ordem tem o papel de debater não apenas o sistema tributário, como também os reflexos dessas eventuais reformas na advocacia e na sociedade”, acrescentou Maneira.
O procurador especial de Direito Tributário da OAB Nacional, Luiz Gustavo Bichara, fez um histórico da tramitação das PEC e engrossou o coro sobre o equívoco do foco da proposta do governo. Segundo ele, “há um consenso de que a reforma tributária é necessária, mas o consenso termina aí”. Bichara apontou que a pressa em tentar resolver o assunto atrapalha. “Dizem que não se vai ao supermercado com fome e é um pouco isso. O que deveria estar sendo feito com base na reflexão está sendo feito no reflexo e acho que esse não é um bom caminho. Esse assunto é tão dinâmico que ele tem mudado muito o tempo todo”, declarou.
“O parlamento estava fazendo, a meu ver, um belo trabalho, evoluindo numa discussão madura, consciente e técnica sobre a reforma. Na semana passada, o governo apresenta uma proposta que, com todo o respeito ao ministro Paulo Guedes, não pode ser chamada de reforma tributária. O que o governo quer fazer é como pintar uma parede da casa e dizer que fez uma reforma. Aquilo consiste num aumento de carga tributária”, criticou. “Essa ideia de ‘reforma’ proposta pelo governo é uma tragédia”, arrematou Bichara.
O deputado Aguinaldo Ribeiro, relator da PEC 45 na Câmara dos Deputados, participou do evento. Ele não quis entrar em detalhes sobre a proposta do governo ao argumentar que prefere aguardar para conhecer o inteiro teor do projeto. “Parece paradoxal discutir uma reforma do sistema tributário num momento de agonia do quadro fiscal brasileiro, mas me parece exatamente o contrário. Enxergo como uma oportunidade reformarmos um sistema que é extremamente complexo, é perverso, é nocivo ao país”, afirmou o deputado.
A tributarista Lina Santin falou sobre caminhos possíveis para a reforma ao comentar, por exemplo, sobre o IVA (Imposto sobre Valor Agregado). “Temos hoje no Brasil, especialmente entre as classes mais simples, que representam mais de 50% de nossa população, uma total alienação sobre o assunto. As pessoas não sabem quanto pagam de imposto. Todo mundo que é isento do imposto de renda tem a falsa sensação de que não é pagador de imposto e isso afasta esse cidadão do debate eleitoral”, disse.
Lina apontou ainda que essa alienação se verifica no debate eleitoral e prejudica o desenvolvimento do tema. “Não se discute carga tributária nas eleições. As pessoas não entendem do tema e causa estranheza falar sobre carga tributária. Temos de conscientizar as pessoas de que todos somos pagadores, não pagamos uma carga tributária baixa. Então quanto mais consciência tivermos, mais cobrança sobre a qualidade dos serviços públicos teremos e isso é extremamente importante para o amadurecimento da cidadania no nosso país”, afirmou.
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