Desjudicialização, danos morais e produtos nocivos ao consumidor são temas de painéis
São Paulo (SP) – Os painéis do período vespertino da I Conferência Nacional de Direito do Consumidor, realizados nesta sexta-feira (5), abordaram os temas da desjudicialização no direito do consumidor; dos reflexos do dano moral no Judiciário; e dos produtos nocivos.
O painel 6 teve como presidente Teresa Cristina Fernandes Moesch, membro da Comissão Especial de Defesa do Consumidor do Conselho Federal da OAB, e como relatora Regina Hiroko Inoue, secretária-geral da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB São Paulo.
A primeira palestra foi de Fabio de Souza Trajano, procurador de Justiça no Ministério Público de Santa Catarina. “Nos parece sempre o caminho mais adequado buscar a via do acordo no direito do consumidor. Os valores constitucionais da dignidade, da liberdade, da justiça e da solidariedade deram e ganham concretude aos direitos básicos do consumidor. O Procon assume papel fundamental nesse contexto, apesar da alternância dos gestores, do pouco investimento nele e em outros órgãos de defesa do consumidor, apresenta índices imensos de resolubilidade”, apontou.
Ele também falou sobre práticas bem sucedidas de parcerias entre o Ministério Público de Santa Catarina e organizações públicas e privadas na seara do consumo alimentar, que aumentaram consideravelmente a qualidade de alimentos de diversas origens para o consumidor final sem a necessidade de judicializar as demandas.
A promotora de justiça do consumidor da Bahia, Joseane Suzart Lopes da Silva, pregou que o engajamento da sociedade para a resolução dos problemas que envolvem as relações de consumo vá para além do poder judiciário. Ao dar exemplos internacionais nesse cenário, firmou que o Brasil deposita a crença de que o Ministério Público terá solução para tudo e que isso infelizmente é uma mera falácia.
“O que precisamos é fortalecimento do sistema nacional de proteção e defesa do consumidor, mas não nos esqueçamos que esse sistema não é composto apenas pelo Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública. Precisamos trabalhar em conjunto com os defensores para um trabalho excelente em prol da população carente. É preciso que o Ministério Público e a Defensoria Pública deem os braços”, disse ela.
Quem fechou o painel foi Diógenes Carvalho, presidente do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon). “A questão central que lanço é se a desjudicialização realmente favorece a proteção do consumidor. Nota-se o surgimento de reiteradas decisões de suspensão de ações judiciais até que a parte autora comprove a tentativa de resolver pela via alternativa. O maior equivoco é exigir do consumidor que ele use o meio alternativo de resolução de conflito. Deve ser uma postura voluntária, não forçada. A desjudicialização é uma das consequências dos métodos extrajudiciais. A necessidade de criá-los e legitimá-los nasce com o reconhecimento de que nem todo conflito precisa virar litígio”, apontou.
Dano moral e os reflexos no Judiciário
O painel de número 7 abordou os reflexos do dano moral no Poder Judiciário e teve como presidente de mesa Patrícia Cardoso Maciel Tavares, coordenadora do Núcleo de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública do Rio de Janeiro (Nudecon), e como relator Ricardo Ferrari Nogueira, procurador-geral do Município de São Paulo e membro da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB São Paulo.
O professor de Direito do Consumidor na PUC-RS e procurador de justiça aposentado do MP do RS, Adalberto Pasqualotto, trouxe o dano moral do ponto de vista da dignidade do consumidor com uma visão antropológica do tema. Ele afirmou ter feito tal abordagem por acreditar que vivemos um momento que parece que os eixos, o enfoque e os próprios valores mudaram. “De um lado temos a evidência de que os danos morais devem ser indenizados, mas temos de outro a ideia de que houve uma banalização dos danos morais. Portanto, é preciso colocar uma lente para saber se efetivamente o dano aconteceu ou não”, disse ele.
“O consumidor só é o rei do mercado na linguagem do marketing. Na verdade as empresas procuram a realização de seus objetivos, evidentemente o principal é o lucro, e é claro que é preciso por o consumidor num trono para que ele se sinta atraído pelas ofertas. O dano moral acaba quebrando essa promessa implícita que o marketing faz. E se acontece a tal falta de respeito? ‘Desculpem o mero aborrecimento’”, ironizou Pasqualotto.
Na sequência, falou Marco Antônio Araújo Júnior, presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB São Paulo e membro da Comissão Especial de Defesa do Consumidor do Conselho Federal da OAB. “Situações aparentemente pequenas já nos tomam tempo, a negligência, a falta de efetividade, tudo isso não nos fere a honra mas acarreta dano. São práticas absolutamente banalizadas, as empresas já provisionam nos balanços patrimoniais o prejuízo com estas ações. O fornecedor entendeu que é muito mais fácil correr riscos do que adequar-se à lei”, afirmou.
O desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Francisco José Moesch, ressaltou que o código brasileiro de proteção e Defesa do Consumidor é um diploma legal moderno e inovador. “Revolucionou enfoques tradicionais, principalmente por adotar a responsabilidade objetiva como forma geral de reparação do dano, diferentemente do Código Civil”, disse ele.
De acordo com Moesch, o pedido genérico de indenização, sem quantificar o valor que entende devido não resulta na inércia da inicial, visto que o valor é definido pelo juiz da causa. “Mostra-se necessário, contudo, que a parte justifique a indenização na inicial, até para que o réu possa se manifestar a respeito do pedido”.
Produtos nocivos
O oitavo e último painel da Conferência abordou a questão dos produtos nocivos e o Fato do Produto. O presidente de mesa foi Thiago Ferreira Wanderley, ex-presidente da Comissão de Direito do Consumidor da OAB Alagoas, enquanto a relatoria foi de Claudio Pires Ferreira, presidente do Conselho Municipal de Proteção e Defesa do Consumidor de Porto Alegre.
A primeira palestra do painel foi de Ana Carolina Caram, diretora do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Ela sintetizou que as principais frentes de atuação do departamento que dirige estão nos processos administrativos, na articulação institucional em nível técnico e na atuação internacional, com destaque para a Rede Consumo Seguro e Saúde das Américas. “Criamos no âmbito do site do Ministério da Justiça uma plataforma chamada Sistema Nacional de Recall, que além de ser um banco de dados, traz alertas sobre os processos em andamento. Se o produto apresenta risco à saúde ou à segurança do consumidor, é condição de recall. É interessante buscar informação e não somente esperar que ela chegue a nós”, alertou.
A diretora jurídica da ACT Promoção da Saúde, Adriana Pereira de Carvalho, falou sobre a redução da aceitação social do tabagismo e reversão da normalização do produto e da indústria do tabaco, bem como da jurisprudência relacionada com o consumo de cigarro. Segundo dados apresentados por ela, de 1989 a 2010 houve 46% queda no percentual de fumantes no Brasil. Porém, ela acrescentou que 428 pessoas morrem por dia no país por causa do tabagismo e que R$ 56,9 bilhões são perdidos a cada ano devido a despesas médicas e perda de produtividade devido ao tabagismo. Adriana afirmou que em contrapartida, a indústria tabagista paga R$13 bilhões em impostos. “A conta não fecha. A arrecadação abrange só 23% da perda que provocam”, disse ela.
Ela defendeu que seja estimulado diálogo entre as áreas do Direito e da Saúde. “Hoje temos uma jurisprudência que prejudica o consumidor”, alertou ela, emendando que prevalecem as teses da indústria do tabaco na jurisprudência dominante. Apesar disso, a dirigente ponderou que o cenário jurídico tem potencial para aqueles que defendem os direitos das vítimas do cigarro. “Uma boa notícia é que tem muita doutrina respaldando o direito das vítimas a indenização. Apesar das decisões em sua maioria favorecerem a indústria, não significa que elas estão certas”, declarou ela.
Amauri Artimos da Matta, promotor de Justiça e coordenador do Procon de Minas Gerais, fechou o painel. Ele usou casos reais que chegaram a seu conhecimento para ilustrar situações que denotam total falta de preparo e cuidado do fabricante para com o consumidor final. Ele ressaltou, ainda, que o STJ tem solicitado reiteradas análises periciais em casos envolvendo erro do fornecedor. “Quem tem o risco de informar sobre os riscos do consumo do produto é o fabricante”, disse.
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