Santa Cruz defende que 2020 será o ano de implementação das vitórias conquistadas pela OAB
O presidente da OAB Nacional, Felipe Santa Cruz, afirmou que 2020 será o ano de implementação das vitórias conquistadas pela OAB no ano passado. Ele participou do I Encontro Nacional sobre os Crimes de Violações das Prerrogativas, evento que discutiu o tema ao longo de cinco painéis, três deles realizados na tarde desta segunda-feira (3). O encontro foi realizado na sede do Conselho Federal, em Brasília.
“Marcamos esse evento para esse dia como um gesto simbólico. Apesar de toda a aridez e da dificuldade do debate público, 2019 foi um ano importante para a advocacia. Tivemos vitórias maiúsculas, que são da estatura que a Ordem pretende para o seu cotidiano de avanço para a advocacia e para o Brasil. Agora cabe implementar essas vitórias e dizer que nesse ano essa será a nossa prioridade. Daí o simbolismo de realizar esta reunião no primeiro dia, na abertura do ano judiciário. Façamos desse ano o grande ano de avanço”, disse Santa Cruz.
O primeiro painel realizado na tarde desta segunda-feira, discutiu a busca e apreensão, prisão de advogados e abuso de autoridade. A vice-presidente da comissão de direito penal do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), Katia Rubinstein Tavares, destacou o papel da advocacia para a democracia e como a união da categoria é fundamental para a implementação e defesa da nova legislação.
“É muito importante o que temos aqui hoje. O interesse e a união de toda a advocacia. Precisamos fazer valer a lei que criminaliza o desrespeito às prerrogativas. A união de classe, com a OAB, com o IAB, como resposta a todas as violações que os advogados vêm sofrendo. O que verificamos atualmente é uma criminalização do exercício da advocacia. Isso é muito sério. Há um ímpeto em quebrar sigilo de advogados. A advocacia não apenas é indispensável para a Justiça, como também, nos momentos mais difíceis, participou da luta pela volta do estado de direito”, disse Katia.
O presidente da OAB-PR, Cássio Teles, afirmou que há um grande desafio de tornar a legislação efetivamente respeitada e de rever alguns conceitos que os tribunais aplicavam. “Citaria um conceito que foi relativizado, mas que precisamos recuperar imediatamente, que é o conceito do sigilo das nossas comunicações com os nossos clientes. Quando um advogado falar com um cliente, ainda que um cliente seja alvo de interceptação, esta conversa está preservada pelo sigilo e quem violar isso está cometendo o crime que agora está previsto na lei 8906”, declarou ele.
O presidente da OAB-SP, Caio Augusto dos Santos, ponderou sobre a importância de levar a luta em defesa das prerrogativas para cada subseção. “O empoderamento das subseções em cada uma das seccionais é fundamental para que cada violação de prerrogativa seja repelida. Como advogados que somos, sabemos que são as provas que podem conduzir à punição de alguém e a sistematização desse novo momento que estamos a vivenciar com as hipóteses de violação das prerrogativas profissionais requer estruturação, adequação, qualificação de todo o nosso país para que as provas dessas ocorrências sejam materializadas pela nossa instituição para que seja possível atestar a conduta equivocada praticada”, afirmou ele.
Ação penal privada
O quarto painel discutiu o uso da ação penal privada na contenção do abuso do poder. O conselheiro federal e presidente da comissão nacional de legislação, Ticiano Figueiredo de Oliveira, falou sobre sua experiência no processo de aprovação do texto da lei de abuso no congresso e fez uma análise crítica do uso da legislação. “O que fica de ensinamento para a gente desse processo de tramitação da lei no Congresso é como a nossa profissão, por vezes, é criminalizada até por colegas. Agora que montamos a frente parlamentar da advocacia, vemos colegas advogados no parlamento que criticam a atuação da advocacia quando tratam de defesa dos nossos interesses. Para que isso não aconteça e a gente consiga continuar trabalhando é importante que não façamos o mau uso desse instrumento. É importante conscientizar os colegas, principalmente aqueles que estão no início da profissão”, disse ele.
A conselheira federal e vice-presidente da Comissão Nacional de Legislação, Georgia Nunes, falou sob a perspectiva da atuação do Ministério Público em relação ao dispositivo legal. “Como o Ministério Público vai atuar nesse seu dever de fiscalizar os crimes de abuso de poder de autoridade? Temos que fiscalizar essa atuação. Este é o nosso papel. Não apenas dos advogados, mas principalmente de nós representantes da advocacia”, defendeu ela.
O conselheiro federal e vice-presidente da Comissão Especial de Garantia do Direito de Defesa, Ademar Rigueira, assinalou que a lei é objeto de resignação e que haverá uma grande dificuldade para que, além da vigência ela tenha aplicabilidade. “Essa vai ser a grande resistência. A grande arma que podemos ter contra essa resistência, que vai ser uma resistência natural, é a ação penal privada subsidiária da pública”, afirmou. “A Ordem pode ser considerada a entidade ofendida para fins de legitimidade da propositura da ação penal subsidiária. Acho que temos de dar esse conselho amplo de ofendido, na discussão temos de trazer que o bem jurídico tutelado é de proteção da OAB mesmo por via reflexa, que há um dever constitucional da OAB, é uma função essencial à Justiça, há interesses coletivos na proteção da advocacia, além daquela lesão individual do advogado, justamente por ter uma dupla titularidade do bem jurídico tutelado”, acrescentou ele.
O conselheiro federal e presidente da Comissão Especial de Direito Processual Penal, Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró analisou a possibilidade de proposição de queixa pelo profissional da advocacia vítima de violação. “Na medida que entendamos que a violação das prerrogativas afeta o exercício da advocacia como um crime contra a administração da Justiça como um todo, parece-me razoável que se estabeleça uma legitimação concorrente em que o Ministério Público pode promover a ação penal pública mediante denúncia, que é a regra que está na lei, mas que isso não retire do próprio ofendido, o advogado que tenha sido violado nas suas prerrogativas, ou num âmbito institucional, da OAB, o direito de promover uma queixa. Obviamente estamos falando de uma situação que dependerá de reforma legislativa. Parece-me muito difícil, no atual cenário, em que a lei diz que a ação é pública em condicionada, que o Supremo Tribunal Federal venha, como fez em relação ao funcionário público, reconhecer que há um direito privado da OAB de promover esta queixa crime”, disse ele.
Desafios
O quinto painel discutiu os desafios da advocacia na aplicação da lei que criminaliza a violação das prerrogativas. A conselheira do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Fernanda Marinela, tratou do tema do ponto de vista do direito administrativo e as consequências da lei de abuso de autoridade, a violação de prerrogativas dentro desse cenário. Inicialmente, ela trouxe exemplo de legislação internacional em países como Alemanha, Portugal, Estados Unidos e Argentina. “Temos no mundo afora outras normas que são mais exigentes e rigorosas que a nossa e que também estão em construção”, disse ela.
“A lei de abuso visa atualizar o ordenamento jurídico. Estávamos falando da lei 4898 de 1965 que foi idealizada ao tempo da ditadura, portanto, o contexto era completamente outro. Precisávamos de uma lei contemporânea, que registrasse a necessidade atual. A segunda questão é a punição do agente público. Esses agentes não eram punidos antes, ou eram, muitas vezes dentro de uma estrutura administrativa precária que efetivamente não conseguiam atingir o resultado. Hoje temos uma punição criminal, uma responsabilização civil”, explicou Marinela, que destacou a legislação como um avanço, mas disse que é preciso ter cuidado na aplicação da lei para que ela traga resultados importantes.
A vice-presidente da OAB-RJ, Ana Tereza Basílio, falou a respeito da postura de autoridades em operações policiais e inquéritos em relação à advocacia ao falar sobre a lei de abuso. “A maior qualidade que a lei de abuso tem foi simbolicamente demonstrar o repúdio do legislador a esses atos praticados sob os aplausos dos incautos da população que desconhecem as normas que deveriam ser aplicadas. Ainda que não se tenha uma autoridade que tenha cometido abuso condenada, com decisão transitada em julgado, o simbolismo é grande. Trata-se da reprovação pública e jurídica dessas condutas”, disse ela.
A conselheira federal e presidente da Comissão Especial de Estudo da Reforma Política, Luciana Nepomuceno, analisou a legislação numa perspectiva do direito eleitoral. “No direito eleitoral temos as figuras do abuso de poder político e do abuso de poder econômico. Ambos tornam o candidato inelegível. Ou seja, o abuso de poder já está presente para retirar um candidato de um pleito eleitoral, para a cassação de um mandato. Diante disso cabe a pergunta: aquele que viola as prerrogativas profissionais não tem de ser punido em razão das violações? Prerrogativa não é privilégio. É uma garantia para que possamos exercer nossa profissão com paridade de armas e exigir que a prestação jurisdicional seja a mais igualitária. Nosso primeiro desafio é fazer prevalecer a lei”, declarou Luciana.
Source: New feed