Painel 33 – Juristas analisam a efetividade constitucional dos direitos sociais

Os participantes da 24ª Conferência Nacional da Advocacia Brasileira assistiram, na manhã desta quarta-feira (28/11), a um debate dedicado à análise da efetividade constitucional dos direitos sociais. Na pauta do encontro, os especialistas abordaram aspectos como o esvaziamento da competência da Justiça do Trabalho por decisões do Supremo Tribunal Federal (STF); a renda universal básica; a regulação do trabalho pelo uso das plataformas digitais; o vínculo de emprego e os escritórios de advocacia; e o trabalho escravo e degradante. 

“O advogado é a voz que se levanta contra os abusos do poder público, um muro contra a violência social e uma peça fundamental na defesa da democracia. A advocacia pode e deve apontar o caminho para uma nação justa e, consequentemente, desenvolvida”, destacou o presidente da mesa, conselheiro federal de Rondônia e vice-presidente da Comissão Nacional de Direitos Sociais da OAB, Elton José Assis. 

O painel, que contou com a relatoria da secretária da Comissão Nacional de Direitos Sociais da Ordem e conselheira federal de Goiás, Layla Milena Oliveira Gomes, e como secretária da mesa, a conselheira federal do Ceará Katianne Wirna, também trouxe para o debate o problema do assédio no ambiente de trabalho e suas repercussões na higidez, previdência ou nas garantias fundamentais.

Esvaziamento de competência

“O SFT vem esvaziando a competência da Justiça do Trabalho sob o argumento de que existem caprichos nas decisões da Corte que teriam um preconceito em relação ao empreendedorismo, que seria o ecossistema de uma indústria de reclamações trabalhistas. Mas o que há, na verdade, é um preconceito contra a advocacia trabalhista e em relação às prerrogativas do segmento”, defendeu a conselheira federal do Pará e membro da Comissão Nacional de Direitos Sociais da OAB Ana Ialis Baretta. “Decisões do STF, invalidando julgamentos da Justiça do Trabalho, tornam o Supremo uma espécie de tribunal recursal trabalhista, em afronta à própria Constituição”, acrescentou.

Para ela, fundamentos estranhos à própria legislação trabalhista vêm gerando não apenas uma grande insegurança jurídica, mas também uma patente insegurança social. Nesse sentido, sublinhou o afastamento da competência da Justiça do Trabalho para julgar os contratos de representação comercial. “Há uma crença tola de que enfraquecendo a Justiça do Trabalho estariam beneficiando o empresariado, mas isso não é verdade, porque os únicos beneficiados, na prática, são os descumpridores”, alertou Ana Ialis Baretta.

O presidente da OAB-ES, José Carlos Rizk Filho, em consonância com a primeira debatedora, disse que há uma indústria de vilipêndios aos direitos trabalhistas. “E neste ponto, destaco a precarização do trabalho dentro dos próprios escritórios de advocacia, que a polêmica entre o STF e o Tribunal Superior do Trabalho (TST) vêm escondendo. Há uma superpopulação de advogados no país, profissionais que necessitam de um piso salarial nacional capaz de recuperar e elevar os ganhos da categoria. O mercado já não absorve todos os formados e o subemprego já é observado”, narrou. Segundo Rizk, “a sociedade clássica tradicional foi substituída pela relação de associado, mas subordinação é evidente, caracterizando uma fraude ao vínculo empregatício”.

Plataformas digitais 

Ao tempo em que a advocacia enfrenta dificuldades nesse sentido, o Legislativo, mesmo com nada menos que 128 projetos de lei que versam sobre o tema, também parece não evoluir na regulação do trabalho em plataformas digitais. “Hoje, 14 milhões de brasileiros trabalham por aplicativos, desafiando a lógica irretorquível de que todo trabalho é humano e que a ‘gig economy’ precisa ser regulada com urgência. Dos projetos em tramitação, 70% versam sobre condições e questões previdenciárias, enquanto 30% tratam da remuneração. Mas o que necessitamos são critérios para caracterização do vínculo de emprego”, defendeu o conselheiro federal da Paraíba e presidente da Comissão Nacional de Direitos Sociais da OAB, Paulo Antonio Maia e Silva. “A subordinação algorítmica é evidente, incontestável, e países como Reino Unido, Espanha, França e Alemanha já a reconheceram. Nossa Constituição, em seu Art. 7º, reconhece os direitos dos trabalhadores, e não apenas dos empregados”, sublinhou.

Maia revelou um dado impressionante: que dos 70% a 80% dos valores das corridas, que são auferidos por um motorista de aplicativo, não sobram nem os 20% a 30% retidos pelo aplicativo, em função da assunção de todos os custos e riscos pelo motorista.

Trabalho escravo

O cenário é ainda pior quando observado o posto que o Brasil ocupa entre os líderes globais no trabalho escravo. “Aqui, também houve uma transformação, porque os escravos do século 21 não estão nas minas de carvão ou em áreas isoladas, mas no centro de São Paulo, onde trabalhadores bolivianos eram mantidos em cárcere privado”, lembrou o desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (TRT-21 / RN), Bento Herculano Duarte. 

“Hoje, existem 53 milhões de pessoas escravizadas no mundo, sendo um milhão aqui, no nosso país. Só no ano passado, quase 3 mil pessoas foram libertadas do trabalho escravo no Brasil e digo libertadas, porque o trabalhador escravizado dificilmente se desliga sozinho desta condição. Mas ainda existe o trabalho degradante, que não paga salários, mantém pessoas em alojamentos sem sanitários ou água potável, em condições sub-humanas, impedindo sua locomoção com vigilância armada”, pontuou Duarte.

A falta de Carteira de Trabalho e Previdência Social assinada é um dos requisitos que qualificam essa degradação e é aí que o país volta a sobressair estatisticamente, já que 50% dos brasileiros empregados não têm o registro assinado. “Não podemos nos esquecer que, mesmo os que estão regularmente empregados enfrentam outro enorme problema trabalhista, que é o assédio, um reflexo do machismo, do sexismo, do racismo e da homofobia tão presentes em nossa sociedade”, lembrou a desembargadora do TRT-4 (RS), Tânia Reckziegel. “O assédio moral e o assédio sexual estão presentes nos mais variados ambientes, inclusive dentro do Poder Judiciário. É algo que só podemos eliminar pela vigilância e pelo comprometimento urgente de instituições e empresas”, destacou.

Renda básica

A renda básica de cidadania foi apresentada pelo deputado estadual Eduardo Suplicy (PT-SP) como uma alternativa para a crise do trabalho. “A renda básica universal é uma proposta antiquíssima, que data de 520 a.C., quando Confúcio observou que ‘a incerteza é pior que a pobreza’. Em uma sociedade mais amadurecida, cada pessoa, de acordo com suas capacidades e necessidades, deve ter em mente a necessidade de erradicação da miséria por meio de um fundo, de valores para além do interesse próprio. Vai fazer 20 anos que foi sancionada a renda básica cidadã brasileira, mas isso não teve reflexos até hoje e, em outubro, sugeri um estudo para análise de custos e implantação prática. Para isso, conto com a apoio da OAB, para materializarmos esse auxílio”, conclamou Suplicy, que foi aplaudido de pé pelos presentes.

Educação

E enquanto essa materialização não ocorre, o secretário executivo adjunto do Ministério da Educação (MEC), Gregório Durlo Grisa, trouxe para o painel os esforços do governo federal para reestruturação da política nacional de ensino médio. “Estamos alterando a Lei do Ensino Médio (Lei 13.415/2017) com uma revisão curricular que inclua a integração da educação tecnológica, o fortalecimento da gestão, a criação de uma plataforma preventiva de alerta sobre abandono ou evasão, foco na preparação para o Enem e uma nova conexão com o mundo do trabalho”, disse Grisa. “Nosso objetivo é preparar os alunos para o mercado de trabalho, quebrando um antigo paradigma de que a formação técnica desestimula o ingresso na faculdade”, concluiu.


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